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4ª temporada Circulação da Balbúrdia –Thiago Araújo| Modelo educativo plurinacional na Bolívia

Escrito por: Mariana Nascimento


No dia 21 de julho a Escola de Formação da Classe Trabalhadora Vânia Bambirra realizou o terceiro encontro da quarta temporada do Circulação da Balbúrdia. A EFOP recebeu Thiago de Sousa Araújo para discutir o seu artigo publicado pela revista Germinal em dezembro de 2021, intitulado O Modelo Educativo Plurinacional: educação curricular na Bolívia, o artigo é oriundo de sua tese de doutorado em Educação pela UFSCar, intitulada A Escola no Estado Plurinacional da Bolívia (2005-2019).


Thiago Matias de Sousa Araújo, mestre em educação pela UFRN e doutor em educação pela UFSCar, pesquisa nas áreas de Fundamentos da Educação, Marxismo e Educação e América Latina. Atualmente é Pedagogo da Assessoria Acadêmica e do Núcleo Interdisciplinar de Suporte ao Estudante do Centro de Tecnologia da UFRN - NISE/CT. Vincula-se aos grupos de pesquisa História, Sociedade e Educação no Brasil (HISTEDBR/UFSCar) e Grupo de Extensão e Pesquisa em Direito, Marxismo e América Latina (GEDIC/UFERSA).


Em um primeiro momento da apresentação, Araújo contextualizou historicamente algumas questões sobre o Estado Plurinacional da Bolívia: atualmente há 37 idiomas oficiais de 37 diferentes povos campesinos originários, os quais têm suas próprias culturas e formas diferentes de organizar a produção e o trabalho, também refletindo em diferentes visões espirituais e religiosas. Estas demarcações são respeitadas na organização curricular, como veremos mais adiante.


A origem e conformação desses povos foi marcada pelo período colonial na América Latina, que passa a organizar a sociedade pela cor e pela proveniência, definindo parte da população como indígenas, os crioulos e os europeus, divisão que é determinante à relações sociais de produção. Essa divisão refletiu nos povos no período de acumulação primitiva e excluiu, principalmente indígenas, dos processos formativos formais. Estima-se que na região viviam cerca de 70 milhões de indígenas e em três anos esse número reduziu para três milhões. Porém, mesmo com a destruição desses povos, a cultura e suas línguas foram preservadas, pr exemplo, a partir do trabalho dos jesuítas na região, ao traduzir a bíblia para os idiomas dos povos originários para catequizar, grafaram a língua originária Quéchua já naquele momento, o que fez ser possível o idioma estar vivo até a atualidade. Algumas grafias só foram produzidas em momentos posteriores.


No tocante à educação, havia a aspiração de uma educação ampla desde a independência da Bolívia após a guerra da libertação em 1924, liderada por Simón Bolívar. Porém esse ideal não triunfou, uma vez que com a reorganização do capitalismo mundialmente, muitos conflitos se instalaram na luta de classes. Por exemplo, como a questão da terra, expressa na política de ex-vinculación que foi uma política de parcelamento da terra e de racismo de classe contra os povos indígenas. Araújo comenta que o que deu no período foi uma Apartheid boliviano, cita que René Zavaleta Mercado caracteriza que o Estado Boliviano era um Estado aparente, ou seja, voltado às oligarquias e não para todos.


O processo de esfacelamento dos povos indígenas e a lei de desvinculação das terras impulsionou que os indígenas buscassem por documentos do período colonial, a fim de comprovar sua vinculação com os territórios onde viviam. Nesse contexto de retomada da história dos povos, surge no país a organização desses povos, que substancia a organização do povo até hoje.


Este histórico de organização culminou que na atualidade, após o povo boliviano passar por diversas crises, a partir da eleição que Evo Morales e Álvaro Linera em 2005 e a consolidação do Estado Plurinacional da Bolívia, foi possível construir na Ley educativa Avelino SIñani - Elizandro Pérez (070/2010) um sistema educativo plurinacional. O sistema educacional incorpora três subsistemas: Educação regular, Educação Superior de Formação Profissional e Educação Alternativa e Especial.


A educação regular, maior das três, é dividida em inicial em família Comunitária não escolarizada (0 - 3 anos) e inicial em família Comunitária escolarizada (4 e 5 anos), primária Comunitária Vocacional (6 - 11 anos), secundária Comunitária Produtiva (12 - 17 anos). Segundo Thiago Araújo, essas denominações demarcam o caráter que é dado à educação, que tem como elemento fundante três fontes: Cosmovisões Andino-Amazônicas, Escuela Ayluu de Warisata (experiência desenvolvida entre 1931-40) e os Conhecimentos historicamente produzidos pela humanidade. Este último, tem como referencial a Ação Dialógica Freiriana e a Histórico-Cultural de Vygotsky.


A educação inicial, primária e secundária têm quatro eixos articuladores: Educación intracultural, intercultural y plurilingüe; Educación para la producción; Educación en valores sociocomunitários; Educación en convivencia con la Madre Tirra y salud comunitária. Estes eixos organizam os campos de saberes e conhecimentos: Cosmos y pensamiento; Comunidad y sociedad; Vida, tierra y territorio; Ciencia, tecnología y producción. A partir desses eixos e campos, o currículo é organizado em Áreas de saberes e conhecimentos para cada nível. A educação secundária tem relação com a reconfiguração da matriz produtiva do país, considerando potenciais produtivos de cada região. Há ainda uma adaptação desse currículo a territórios onde as populações são menores, como vilarejos e aldeias respeitando os costumes e tradições destas.


Araújo trouxe dados do Ministério da Educação da Bolívia sobre a adesão por área geográfica ao novo modelo. No nível inicial, no meio rural em 2011 a adesão era de 47,35%, saltando para 82,69% em 2018; e no meio urbano, no mesmo período, passou de 71,14% para 92,6%. No nível primário, em 2011 o meio rural contava com adesão de 73,65% e o meio urbano com 80,21%, já em 2018 saltou, respectivamente, para 95,53% e 97,6%. No nível secundário, o qual passou a ser obrigatório somente na nova lei de 2010, o meio rural contava com uma adesão de 39,07% em 2011 e de 66,57% em 2018; e o meio urbano em 2011 para 2018 saiu de 51,17% para 77,82%.


O número total de docentes também dá um salto nos dados dos anos de 2004, antes da eleição, e 2018, de 98.839 e 132.092, respectivamente., bem como a remuneração destes que atingem mais faixas salariais (os dados detalhados são possíveis de conferir no vídeo do Circulação no Youtube). E o investimento total na educação cresceu de 2006 para 2018 em 303,51%. Segundo Araújo, são indicativos importantes, pois mesmo considerando a inflação, a moeda local valorizou no período mencionado e houve um incremento significativo nos investimentos voltados à educação.


Após a apresentação o espaço foi aberto para perguntas, que giraram em torno de qual a investida dos capitais sobre a educação, como elaborar sobre o Estado burguês e o Estado Plurinacional. Muitos elementos deste texto estão aprofundados e esquematizados na apresentação de Thiago Araújo, com mais detalhes e elementos, e podem ser conferidos no vídeo do canal no YouTube da EFOP Vânia Bambirra. O texto usado como base para a apresentação e a tese do autor estão disponíveis virtualmente na Biblioteca da EFOP.


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