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Relato do Grupo de Leitura - Uberização, trabalho digital e Indústria 4.0 de Ricardo Antunes (org.)




Escrito por: Giulia Molossi Carneiro e Lara Bergamo Iamada


O Grupo de Leitura sobre a obra “Uberização, trabalho digital e Indústria 4.0”, organizada por Ricardo Antunes, contou com 4 encontros no período de 29 de março de 2022 até 03 de maio de 2022. A obra é uma coletânea de artigos que discute os temas do trabalho digital, da uberização e plataformização do trabalho, do fenômeno da Indústria 4.0 e suas consequências para o universo laborativo e para a vida dos trabalhadores e trabalhadoras.


O livro traz dezenove artigos de importantes pesquisadores e pesquisadoras, brasileiros e estrangeiros, que investigam, em diferentes setores, os impactos sociais decorrentes da expansão do universo maquínico-informacional-digital. No Grupo de Leitura, foram discutidos cinco dos dezenove artigos.


No primeiro encontro, foi discutido o texto de Ricardo Antunes, intitulado “Trabalho intermitente e uberização do trabalho no limiar da indústria 4.0”, que tratou, dentre diversos aspectos, sobre: a uberização ser uma forma aparente de prestação de serviços que, pouco a pouco, faz desaparecer as relações de assalariamento e vela mais ainda a exploração do trabalho.


No segundo encontro, foi discutido o texto “Trabalho Digital” de Mark Graham e Mohammad Amir Anwar. O artigo discorre, entre outras coisas, sobre a ascensão do trabalho digital que, com o rompimento da relação entre tempo (de produção e de entrega) e distância (entre produto e consumidor), representa uma migração em massa do trabalho – que se dissolve por todo o globo simultaneamente – sem, entretanto, uma migração dos trabalhadores, tornando seus trabalhos uma mercadoria passível de exportação e concedendo-lhes pouca voz e poder de barganha por melhores condições.


No terceiro encontro, estava em discussão o capítulo 4, intitulado “Plataformas digitais, uberização do trabalho e regulação no capitalismo contemporâneo”, de Vitor Filgueiras e Ricardo Antunes. Nesse encontro, discutiu-se muito sobre o conceito de uberização, principalmente porque a apresentação foi realizada por Nívea Souto Maior e Viviane Vidigal, duas pesquisadoras da área. O debate foi ampliado em uma outra atividade da EFoP, o Circulação da Balbúrdia, que pode ser acessado na íntegra no YouTube.


No quarto e último encontro, foram discutidos os capítulos “Uberização: gerenciamento e controle do trabalhador just-in-time” de Ludmilla Costhek Abílio e “Contribuições críticas da sociologia do trabalho sobre a automação” de Ricardo Festi.


A indústria 4.o é apresentada no livro como uma ampliação do “trabalho morto”, ancorada nas novas Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs) que, automatizando o controle da lógica empresarial, inserem-se como um mecanismo de acumulação de capital. Cabe ressaltar que, sem trabalho humano, o capital não se reproduz, visto que as máquinas apenas potencializam o valor, mas não o produzem.


Dessa forma, há uma dinâmica que, para além da expansão da informalidade, expande também uma noção "empreendedora” de si mesmo. Assim, impelidos a se sentirem como empreendedores, esses trabalhadores são colocados em uma falsa posição de independência e competitividade. Isso explicita como ideais liberais vão servindo também para que esse tipo de trabalho se perpetue com êxito em seu objetivo, de modo que individualiza a experiência de trabalho e diminui a potência de organização, mobilização e revolta da classe trabalhadora.


Está em destaque, portanto, o debate da tecnologia como um ponto chave para discutir as novas relações de trabalho. O maquinismo e a automação aparecem como um avanço da indústria e o trabalho digital, como condição para o avanço da acumulação capitalista. Porém, como são feitas essas máquinas? Também com trabalho! Ou seja, a tecnologia é resultado de relações sociais e, portanto, produz subjetividade. Não é algo que simplesmente existe como um avanço, mas como resultado de trabalho.


O debate realizado nos quatro encontros possibilitaram discussões que circularam em torno da estruturalidade dessa forma brutalizante de relações de trabalho e sobre a essencialidade destas no próprio processo de acumulação do capital que, objetivando a ampliação das fronteiras externas ou internas para sua expansão, atualiza e metamorfoseia as formas de trabalho.


É nesse sentido que foram apresentados alguns contrapontos, principalmente sobre o conceito de “uberização”, que poderia vir a significar mudanças subjetivas e objetivas na situação do trabalho no Brasil, bem como uma mudança na disponibilidade do exército industrial de reserva, visto que quando há concentração de capitais, forma-se uma massa de trabalhadores disponíveis.


Sobre a alteração das condições de trabalho, foi tratado que, para a empresa Uber, mais importante era trazer aos países uma nova concepção de trabalho do que, necessariamente, obter lucros. Assim, a ascensão da empresa “Uber”, cabe pontuar, diz sobre uma aceleração da capacidade de normalização de um regime de trabalho inusitado que se apresentou, para a classe trabalhadora, como um processo representante de seus próprios interesses.


Sobre isso, outro aspecto muito comentado nos encontros foi que a característica sociológica dos textos, muitas vezes, são permeados por uma descrição do processo de trabalho sem definir o processo de acumulação capitalista (o começo de uma crise, o fim de uma crise, uma retomada econômica) e que isso dificulta o entendimento de qual a ontologia do processo de trabalho.


Sobre as plataformas de trabalho, devemos questionar a todo momento os impactos disso na vida da classe trabalhadora, dado que a forma social tem maneiras objetivas e subjetivas de operar na formação do trabalhador. Nesse sentido, o trabalho é, ao mesmo tempo, educador para um tipo de vida. Um trabalhador do Ifood, por exemplo, não sabe se está recebendo menos corridas e sendo tolhido na sua atuação na plataforma por fazer greve – visto que essas plataformas condensam todas as informações sobre o trabalhador: a que velocidade anda, onde está, se está parado.


De toda forma, é fundamental essa implicação dos autores no trabalho com esse conceito de grande amplitude e de muitos significados, a uberização. Os autores se empenharam em pensar o trabalho na atualidade e propor um horizontes de lutas, portanto, é uma obra que não pode passar sem um estudo sistemático para aqueles que buscam estudar o que está ocorrendo atualmente no campo do trabalho.



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